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De volta, Kaká cobra mudanças no futebol brasileiro

Ana Maria Miranda
Ana Maria Miranda
Publicado em 01/09/2014 às 10:07
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Após 11 anos na Europa, Kaká volta ao São Paulo / Foto: Reprodução

Após 11 anos na Europa, Kaká volta ao São Paulo Foto: Reprodução

“Cara, estou muito empolgado”. Foi com um largo e verdadeiro sorriso que Kaká falou sobre sua volta ao São Paulo após 11 anos na Europa. O craque fica até o fim do ano no Morumbi antes de embarcar na aventura de jogar nos Estados Unidos, mas vive intensamente cada momento no clube. Na longa entrevista exclusiva ao jornal O Estado de S. Paulo, publicada nesta segunda-feira, Kaká fala sobre a alegria de voltar, sua importância para transformar o São Paulo em um grupo forte e alerta: o futebol brasileiro precisa mudar para não ficar para trás e pede mudanças no calendário.

Onze anos depois, o que mudou em você, no São Paulo e no futebol brasileiro?

Amadureci muito. Volto casado e com dois filhos, tendo atingido títulos e o topo do futebol mundial com o prêmio de melhor do mundo. No São Paulo a estrutura melhorou muito; já era excelente e se renovou ainda mais. O futebol brasileiro é a minha maior preocupação agora, temos muito o que melhorar.

Ainda tendo lenha para queimar, por que resolveu passar mais tempo nos Estados Unidos?

Minha escolha foi de querer fazer parte da expansão do futebol americano. Passei em clubes de tradição, estou indo para um futebol que está crescendo e num clube que está nascendo. Queria um pouco essa novidade na minha carreira.

Qual a sensação de voltar ovacionado pela torcida que te vaiou na sua saída em 2003?

Minha volta foi sensacional e demonstra que não há nenhuma amargura nem da torcida nem minha, não houve rejeição de nenhuma parte.

Nesse tempo fora, recebeu propostas de muitos clubes brasileiros? Jogaria em outro time?

Quando as coisas caminharam para uma volta, falei para meu pai, que também é meu empresário: “Converse com eles e faça de tudo para dar certo”. Minha prioridade sempre foi voltar para o São Paulo.

O impacto da sua volta é sentido em todos os aspectos. Você consegue enxergar isso?

Aos poucos isso vai passando e eles me veem como um jogador do elenco. Para os mais novos eu tento passar esse senso de profissionalismo, de chegar cedo, fazer meus treinos, cumprir os horários e fazer o que preciso e mostrando vontade.

Nota-se que você está visivelmente feliz com essa volta...

Cara, estou muito empolgado, superfeliz. Onze anos morando fora, quando você volta e reencontra os amigos, tem uma vida social e pode encontrar pessoas que cresceram comigo, vivendo de novo essas rotinas. Está sendo demais.

Se o Orlando liberar e depender apenas de você, fica para a Libertadores se o São Paulo se classificar?

É algo para se pensar mais para frente. Estou muito focado nesse momento, o que vai acontecer agora, no Brasileiro.

Ascensões meteóricas como a sua podem ser prejudiciais para um jogador jovem?

Existem muitas situações em que você se empolga muito fácil. Tive muitos momentos assim e foram meus pais que me ajudaram a manter os pés no chão, depois que casei minha esposa também passou a me ajudar muito nesse sentido. Eles diziam “não é porque você ganhou o prêmio de melhor do mundo que você precisa se achar melhor o tempo inteiro”. Essa base é fundamental.

E você passa essa experiência para os mais novos?

Em geral procuro conversar, mas a conversa às vezes não surte tanto efeito quanto a demonstração prática.

A explosão das mídias sociais deixou o jogador mais alienado?

Quando subi para o profissional, tinha um telefone pré-pago que a patrocinadora nos deu. Hoje, o moleque da base tem o telefone, o Instagram, o Twitter e essa é a realidade e não dá para tirar isso. É preciso educar e ensinar. É uma arma, se é boa ou ruim depende de como você usará.

Mas não falta um pouco de politização?

Não precisamos ter opinião sobre tudo, mas um pouco precisa buscar. Mas não acho que isso seja do jogador, é um pouco do povo brasileiro. É preciso se informar, se não ficamos refém do que os outros nos falam.

Você sofreu no Real Madrid, mas mesmo assim ficou quatro anos. Por quê?

Os vínculos que tive na minha vida sempre foram muito longos e preservo isso. Os quatro anos que passei lá foram muito bons, até eu decidir ter um pouco mais de continuidade para ter chance de ir para a Copa.

Acha que jogou o suficiente para ter uma chance?

Essa escolha é muito difícil, falar se deveria ou não estar. Acho que tive uma boa temporada no Milan no número de jogos e na qualidade, mantive a continuidade.

Ficar fora te frustrou?

De forma alguma. Justamente por ter feito tudo o que estava ao meu alcance. Não tenho frustração nenhuma porque fiz tudo o que era possível.

O vexame da Copa indicou que o futebol brasileiro está atrasado?

O resultado final é exagerado, mas serve de alerta no sentido de organização e planejamento. Depois isso irá refletir na seleção, mas seleção é uma coisa e futebol brasileiro é outra; no fim elas acabam interagindo.

Você tem ideias que poderiam ser implementadas?

Acredito que a principal mudança seja em relação ao calendário, que é muito pesado. Se o clube não tem um plantel grande, é muito difícil que o time se mantenha. Os clubes precisam se profissionalizar, a parte técnica também, poderiam ser oferecidos cursos que os treinadores precisassem fazer para trabalhar e se reciclar.

É possível haver essa mudança com José Maria Marin e Marco Polo Del Nero?

Não sei como eles trabalham, não tive muita relação com eles. É difícil para mim, que estou fora, falar alguma coisa, é muito mais profundo do que se falar que tem ou não que mudar.

Quando você falou sobre o Bom Senso, deu a impressão de não querer se envolver demais. Por quê?

Gosto do Bom Senso, é um movimento que tem ideias interessantes. Estou voltando agora, preciso de tempo para ler o futebol brasileiro, me informar sobre o que está acontecendo para depois tomar uma posição mais firme em relação a tudo isso.

Falta algo na sua carreira?

Vim para o São Paulo para fazer parte desse grupo e ao mesmo tempo ajudar que esse conjunto seja um grupo muito forte. Quando for para os Estados Unidos, quero ser embaixador da Liga e ajudar o Orlando.

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