Ciclismo

Lance Armstrong se compara ao vilão de Harry Potter

Marcella César de Albuquerque Falcão
Marcella César de Albuquerque Falcão
Publicado em 12/06/2015 às 8:45
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Armstrong dominou o ciclismo de forma esmagadora na última década / Foto: JOEL SAGET / AFP

Armstrong dominou o ciclismo de forma esmagadora na última década Foto: JOEL SAGET / AFP

Visto como a encarnação do mal, ninguém ousa falar seu nome: banido para sempre do ciclismo, Lance Armstrong se sente como Voldemort, o vilão da saga Harry Potter.

Em entrevista a vários jornalistas britânicos, um deles da AFP, na sua casa de Aspen, Colorado, o americano de 43 anos abordou sem tabu vários assuntos, da sua imagem manchada pelo doping ao engajamento em causas humanitárias.

 

'Aquele que não deve ser nomeado'

 

Armstrong dominou o ciclismo de forma esmagadora na última década, sagrando-se heptacampeão da Volta da França, de 1999 a 2005, mas teve todos os seus títulos retirados por causa do doping. Banido para sempre do esporte, o americano ainda não digeriu a punição.

"Como se chama mesmo a personagem de Harry Potter 'cujo nome não deve ser pronunciado'. É Voldemort? Então, para mim, é a mesma coisa para tudo".

"Se você assistir à Volta da França na TV americana, é como se não pudessem mencionar meu nome".

"As pessoas não são estúpidas. Todo mundo sabe o que aconteceu nas décadas de 90 e 2000, mas se olhar para os resultados oficiais, não há vencedor, apenas vice-campeões ou terceiros colocados. Não faz sentido. Daqui a dez anos, ninguém mais vai aceitar isso".

 

'Safado total'

 

O ex-campeão caiu do pedestal e não saiu ileso. Da glória ao banco dos réus, Armstrong admite tentar resolver os problemas pessoais no divã.

"É estranho consultar um psicanalista. As pessoas perguntam: 'como assim, você é um cara frágil?'. Mas na verdade, temos profissionais para nos assessorar em todos os aspectos da nossa vida. Estou mais ou menos vendo um psicanalista faz um tempo. Cada vez mais, nos últimos meses. Sempre podemos melhorar como pessoas, e só Deus sabe o quanto eu ainda posso melhorar. Por muito tempo, fui um safado total".

 

Risco de falência

 

Em julho começa o julgamento de Armstrong, sendo que na parte lesada encontram-se o ex-companheiro de equipe Floyd Landis e o governo americano. O ciclista era patrocinado pela US Postal, serviço de correios dos Estados Unidos, que é um órgão público, e cobra indenizações milionárias.

"É um julgamento de 100 milhões de dólares" avisa Armstrong. "Tudo que posso dizer é que estou confiante. Mas não esbanjo tanta confiança, porque dá azar. Se os jurados me mandarem pagar 100 milhões, Landis vai receber 33! Se eu perder, não vou mais poder receber vocês nesta casa", lembra o americano, no seu luxuoso chalé de Aspen, a estação de esqui mais conceituada dos Estados Unidos.

"Na verdade, não vou ter mais casa nenhuma. Não tenho 100 milhões de dólares", garante o texano, que afirma ter perdido 75 milhões de dólares em contratos de patrocínio desde que confessou ter se dopado, em janeiro de 2013, no programa da apresentadora Oprah Winfrey.

 

Retorno à França

 

Armstrong participará de uma ação beneficente nas estradas da Volta da França, dos dias 4 a 26 de julho. O convite foi feito pelo ex-jogador de futebol inglês Geoff Thomas, que superou uma leucemia. O americano deu esperança a milhares de pessoas ao vencer o câncer no início da carreira, antes do seu nome ser manchado pelo doping.

A União Ciclista Internacional (UCI) não vê com bons olhos este retorno do americano no ambiente do 'Tour', denunciando uma "falta de respeito" e prevendo reações negativas na França.

"Posso estar enganado - e já me enganei muitas vezes na minha vida -, mas já voltei à França recentemente, e, quando caminhava nas ruas, ou entrava em cafés e restaurantes, não sentia nenhuma rejeição".

"As pessoas pensam que tenho uma péssima relação com o país e seu povo, mas gosto de ir para lá. Gosto da França. As pessoas são como são, como em todos os lugares. Tem pessoais legais, outras nem tanto".

 

'Impacto negativo'

 

"Sinto muito pelos fãs, pelas pessoas que me apoiaram, me defenderam, e que, afinal de contas, se sentiram como idiotas".

"Realmente sinto muito por isso. Estou preocupado com Mary-Jane, no Ohio, ou Doug, na Pensilvânia, ou Liam, em Birmingham. Se pudesse iria visitar todas essas pessoas ao redor do mundo e pediria desculpas, olhos nos olhos".

"O escândalo teve um impacto negativo, porque Chris Froome (campeão da Volta da França em 2013) e outros caras precisam responder a várias perguntas sobre um cara velho como eu. Muitos patrocinadores foram embora, corridas sumiram do mapa e a mídia deu as costas".

"O mais lamentável foi o que houve com a Fundação (Livestrong, de luta contra o câncer, fundada pelo americano). As doações despencaram, e o dinheiro era destinado a ajudar pessoas. Estamos falando de uma organização que arrecadava 50 milhões de dólares por ano, para ajudar 500.000 pessoas".

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